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Parto: direito a acompanhante?
Terça-feira, 25 Novembro de 2014 - 11:11 | Cândido Ocampo
Não é incomum surgir questionamentos nas maternidades sobre o direito à presença de um acompanhante durante o parto.
De fato, a Lei Federal nº 11.108/05 (vide Resolução 36/2008 da Anvisa), garantiu às parturientes, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o direito de ter um(a) acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.
Esse(a) acompanhante é de livre escolha da gestante.
Razoável que seja assim, pois várias pesquisas baseadas em evidências científicas apontam que o acompanhamento da gestante por alguém de sua relação reduz a duração do trabalho de parto, o uso de medicações para alívio da dor, o número de cesáreas, a depressão pós-parto e se constitui em apoio para amamentação.
Não por acaso, foi instituído o chamado “parto humanizado” no âmbito do serviço público de saúde.
No entanto, o que vem ocorrendo é que muitos casais exigem que as unidades de saúde permitam que o pai presencie o nascimento de seu filho por cirurgia cesariana. Muitos vociferam que se trata de um direito indiscutível e inalienável da personalidade, constituindo ofensa moral a sua negativa.
Não é bem assim.
Há muito se implantou certa tolerância para que o pai presencie o nascimento de seu filho, inclusive filmando e tirando fotos.
Hoje, com a disponibilização de meios de comunicação on-line (a exposição da privacidade está em moda), não é raro o pai se entregar à empolgação do momento e mostrar ao mundo, em tempo real, que seu filho nasceu.
No entanto, tratando-se de cesariana há o risco inerente a qualquer procedimento médico invasivo, principalmente de infecção, sendo que a desnecessária presença de mais uma pessoa no centro cirúrgico eleva a possibilidade de sua ocorrência.
Também existem implicações espaciais, uma vez que os centros cirúrgicos são projetados de acordo com as necessidades operacionais, não havendo previsão, por óbvio, da presença de pessoas estranhas à equipe de saúde.
Além dessas questões técnicas propriamente ditas, ainda existe a possibilidade de surgir alguma intercorrência durante a cirurgia que exija da equipe médica maior atenção, não sendo possível desviar seus esforços para atender eventual (e natural) desequilíbrio emocional do pai por presenciar o surgimento do fortuito com sua esposa e filho, além, é claro, dos famosos e inconvenientes desmaios por não suportar a natural emoção de ver pela primeira vez seu filho.
Todas essas questões devem ser levadas em consideração antes de se permitir a presença do pai no centro cirúrgico durante o procedimento.
Caso surja algum problema ligado à presença de pessoas estranhas à equipe médica no centro cirúrgico, o hospital responderá objetivamente (independentemente de culpa) por eventuais danos causados à terceiro, ou seja, à parturiente e filho.
Se a unidade de saúde decidir pela não permissão do pai no centro cirúrgico, é importante que esta informação seja repassada ao casal antes do dia da realização do procedimento, evitando constrangimentos num dia especial, em que a paz e tranquilidade são altamente necessárias.
Recomendamos, inclusive, que se faça menção expressa (da não permissão) no contrato de prestação dos serviços obstétricos firmados entre a unidade hospitalar e o paciente/consumidor.
Não havendo previsão contratual sobre a possibilidade da presença de estranhos no recinto médico durante a cesariana, não há o dever legal da unidade em permitir que isso ocorra.
O bradado direito subjetivo público só existe nos casos de partos ditos “normais” (ou naturais), que pelas suas características faz-se necessário o apoio emocional à parturiente de um acompanhante de sua escolha.
Nada mais justo.
O autor é advogado atuante no ramo do Direito Médico.
candidoofernandes@bol.com.br