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Gravidez é questão particular, diz juiz ao negar pedido de mulher para refazer testes de concurso
Segunda-feira, 21 Fevereiro de 2011 - 09:13 | RONDONIAGORA
O juiz convocado Francisco Prestello de Vasconcellos, das Câmaras Especiais Reunidas do Tribunal de Justiça de Rondônia negou a ordem em mandado de segurança impetrado por uma mulher grávida que pedia nova data para realização de testes físicos, no concurso para provimento de novos agentes penitenciários no Estado. Para o magistrado, uma questão particular não pode estar acima do interesse público. O magistrado ponderou ainda que quando realizou a inscrição, certamente ela já sabia da gravidez e assumiu o risco de, nesta condição, participar do concurso.
Câmaras Especiais Reunidas
Ana de Souza Ardaya impetrou mandado de segurança para ter oportunidade de realizar os testes em data futura. Ela conta que durante testes que tentou realizar, sentiu dores e, mesmo avisando antes a bancada examinadora, os fiscais disseram que nada poderiam fazer. Para o juiz a mulher não tem mesmo razão. “Assim, é salutar a igualdade de tratamento entre os candidatos inscritos no certame, não sendo lícita a pretensão da impetrante, pois uma questão particular não pode se sobrepor ao interesse público, desde que a concessão de exceção não prevista no edital se constitua em privilégio inconstitucional”, disse. Veja íntegra da decisão:
Câmaras Especiais Reunidas
Despacho DO RELATOR
Mandado de Segurança nrº 0001641-54.2011.8.22.0000
Impetrante: Ana de Souza Ardaya
Advogado: João de Castro Inácio Sobrinho(OAB/RO 433A)
Advogada: Marisâmia Aparecida de Castro Inácio(OAB/RO 4553)
Impetrada: Secretária de Estado da Administração
Relator:Juiz Francisco Prestello de Vasconcellos
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Ana de Souza Ardaya visando a realização de teste de capacidade física em data posterior à determinada no edital do concurso para provimento de vagas para o cargo de agente penitenciário, vez que encontra-se gestante, necessitando de repouso absoluto (f. 45).
Informou que a prova física foi marcada para o dia 24.1.11, porém ao realizar o teste físico especificado no edital no item 8.10.1, “b”, do tipo remador, passou a sentir fortes dores no abdômen não conseguindo executar o exercício corretamente.
Alega, que ao chegar no estádio para realizar a prova, informou aos fiscais que estava grávida, tendo como resposta que nada poderiam fazer e, caso não o fizesse, estaria automaticamente eliminada.
Diante disso, fez as provas, porém não conseguiu realizar no tempo estipulado pelo edital, prova disso foi que na corrida a requerente mesmo com sangramento fez um percurso de 1.700m, o estipulado era de 1800m.
O edital previa uma segunda chance aos candidatos incapacitados por qualquer um dos testes (item 8.18), com data marcada para o dia 9.2.11, conforme anexo II de referido edital (f. 37).
A impetrante protocolizou no dia 7.2.11 mandado de segurança com pedido de liminar, requerendo prazo de 180 dias após o parto para ser submetida aos exames, no plantão do 1º grau, sendo declarada a incompetência daquele juízo, em 8.2.11 (f.50), determinando a remessa a este Tribunal, para apreciação.
DECIDO
O Edital n. 367/GDRH/GAB/SEAD, de 29 de outubro de 2010, que rege o certame, contém regras expressas que inviabilizam a pretensão requerida, quando dispõe, em seu item 8.14, que “Os casos de alteração psicológica ou fisiológica, temporária, que impossibilitem a realização do teste ou diminuam a capacidade física dos candidatos, não serão levados em consideração, não sendo dispensado nenhum tratamento privilegiado.”
Como é cediço, o edital faz lei entre as partes, vinculando tanto a Administração quanto os candidatos às regras nele determinadas.
Sobre o assunto já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DE APTIDÃO FÍSICA. REALIZAÇÃO POSTERIOR EM RAZÃO DE GRAVIDEZ. SEGURANÇA CONCEDIDA PELA ORIGEM, NÃO OBSTANTE DETERMINAÇÃO EXPRESSA, EM SENTIDO CONTRÁRIO, NO EDITAL RESPECTIVO. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS.
Em caráter excepcional, a jurisprudência tem-se firmado no sentido de receber os embargos de declaração com efeitos modificativos, nos casos de erro material evidente e quando não existir outra forma recursal para a sua devida correção.
Havendo, no edital do concurso determinação expressa vedando o tratamento diferenciado de candidatos ou realização de posterior teste de aptidão física, em razão de alteração psicológica ou fisiológica (estados menstruais, gravidez, luxação, etc.) não se reconhece o direito líquido e certo alegado pela impetrante.
Os embargos declaratórios não têm como objeto o rejulgamento de causa já decidida. Ausentes os seus pressupostos, deve ser prestigiada a decisão atacada.
Embargos declaratórios parcialmente acolhidos, tão-somente para sanar o erro material apontado quanto ao termo inicial da licença-maternidade gozada pela embargante. (EDcl no REsp 346.203/DF, Rel. Min. VIDIGAL, EDSON. QUINTA TURMA, julg. em 5/3/2002, DJ 8/4/2002, p. 268)
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PUBLICO. CAPACITAÇÃO FISICA. PROVA REALIZADA EM DATA POSTERIOR POR FORÇA DE LIMINAR. ORDEM DENEGADA. INEXISTENCIA DE FATO SUPERVENIENTE.
1- Se o edital do concurso expressamente impede tratamento diferenciado ou realização de nova prova de capacitação física nos casos de alteração psicológica ou fisiológica (estados menstruais, gravidez, contusões, luxações, fraturas, etc.), não há direito liquido e certo a ser resguardado.
2- Não há que se falar em existência de fato superveniente com a aprovação da impetrante na prova de capacitação física.
a situação da impetrante, precária e provisoria, dependia do julgamento do mérito do “mandamus”.
3- Recurso improvido. (RMS 5.742/RS, Rel. Min. GONÇALVES, FERNANDO. SEXTA TURMA, julg. em 18/3/1997, DJ 22/04/1997, p. 14451)
Ademais, ao fazer a inscrição do concurso a impetrante assumiu o risco eventual de não poder participar da prova prática, caso fosse aprovada na prova objetiva. Isso porque, quando da realização da inscrição, no período de 3 a 25.11, certamente a impetrante já estava em fase gestacional, vez que conforme ultra-sonografia obstétrica na data de 27.1.11, apresentava-se com 14 semanas e 2 dias de gravidez(f. 48), além disso, no mesmo edital, item 4.1 é constado o seguinte:
“Antes de inscrever-se, o candidato deverá tomar conhecimento das normas e condições estabelecidas neste Edital, incluindo seus Anexos, partes integrantes das normas que regem o presente Concurso Público, das quais, não poderá alegar desconhecimento em nenhuma hipótese.”
Nesse caso, não pode a Administração ficar à mercê da condição física da impetrante, como bem decidiu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA INVESTIGADOR DE POLÍCIA DE 3ª CLASSE. CANDIDATA EXCLUIDA DE CONCURSO POR NÃO REALIZAR PROVA DE APTIDÃO FÍSICA EM RAZÃO DE GRAVIDEZ. PREVISÃO EDITALÍCIA NO SENTIDO DE QUE A PROVA DE CAPACITAÇÃO FÍSICA ERA DE CARÁTER ELIMINATÓRIO, SENDO EXCLUÍDO O CANDIDATO QUE APRESENTASSE IMPOSSIBILIDADE DE REALIZÁ-LO INTEGRALMENTE NA DATA ESTIPULADA. AUSÊNCIA DE INFRINGÊNCIA A DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUE NÃO PODE FICAR A MERCÊ DA CONDIÇÃO FÍSICA ADEQUADA DO CANDIDATO, POIS TAL CONDUTA IMPORTARIA EM SOBREPOSIÇÃO DO INTERESSE PARTICULAR AO INTERESSE PÚBLICO, ALÉM DE COMPROMETER OS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, DA LEGALIDADE E LISURA DO CONCURSO PÚBLICO. SENTENÇA REFORMADA. PROVIMENTO DO RECURSO. (TJ/RJ. APELACAO CIVEL N. 2008.001.06272, DES. LEILA MARIANO - Julgamento: 20/02/2008 - SEGUNDA CAMARA CIVEL)
Como ensina Hely Lopes Meirelles:
O concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, consoante determina o art. 37, II, da Constituição Federal” (Direito Administrativo Brasileiro, 32 edição, p. 434).
Assim, é salutar a igualdade de tratamento entre os candidatos inscritos no certame, não sendo lícita a pretensão da impetrante, pois uma questão particular não pode se sobrepor ao interesse público, desde que a concessão de exceção não prevista no edital se constitua em privilégio inconstitucional.
Dessa forma, não há ocorrência de ato ilegal ou abusivo a ser sanado, inexistindo, conseqüentemente, direito líquido e certo a ser amparado pelo mandado de segurança.
Isto posto, diante da inexistência de violação ao direito líquido e certo da impetrante, denego a segurança, o que faço monocraticamente na forma do art. 557 do Código de Processo Civil e art. 139, IV, do RITJ/RO.
Porto Velho, 18 de fevereiro de 2011.
Juiz Convocado Francisco Prestello de Vasconcellos
Relator