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UM ESCRIBA DE RABO PRESO COM O LEITOR
Quinta-feira, 10 Março de 2011 - 16:07 | Antônio Serpa do Amaral
Por Antônio Serpa do Amaral Filho
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Paulo Queiroz Bezerra morreu como escrevia: deliberadamente livre. Não escrevia para viver, vivia para escrever. Por obsequioso voto de renúncia às tentações do mundo, serviu às redações, mas não serviu a si mesmo. O existencialismo de Jean Paul Sartre pode lhe ter dado combustível para o suposto suicídio. Achar valor na vida, todos acham. Paulo Queiroz fez diferente: achou valor também na morte. Como todo falecido, não tinha só boas qualidades. O portentoso escriba tinha imensos defeitos. Um deles, por exemplo, era ter o rabo preso com o leitor. Outro grande defeito dele: o amor pela verdade. Por último, uma das suas maiores invirtudes: era escrevinhador de um texto comprometido com a cidadania, com a justiça e com a crítica social. Dentre outros, esses eram seus principais defeitos.
Se quando morre o homem fica a fama, no caso de Paulo Queiroz, morre o homem e fica a chama, a pira incandescente e flamejante da decência profissional, da abnegação vocacional incorruptível, da prática jornalística ilibada, humanística, etílica, risonha e simples de um escriba que tinha o rabo preso com o leitor. Em respeito à sua memória, saúdo seus seguidores e correligionários da mesma confraria redacional.
É óbvio que Paulo Queiroz era nosso jornalista mais inteligente, mais refinado e culto. Todavia, a destinação que dava aos seus atributos é que não era assim tão óbvia. Errático, ele optou por destinar esse conjunto de talentosas ferramentas ao texto comprometido com a cidadania, sempre morrendo de amor pela verdade, praticante que era de uma literalidade absoluta da etimologia de filo sofo. Não bastasse ter no leitor a maior razão de ser de sua profissão, Paulo via naquele que o lia diariamente não apenas um decodificador mecânico de seus signos de linguagem, mas um cidadão querendo ser informado da maneira mais correta e inteligente possível dos fatos da vida social. Para cumprir esse mister com altivez e maestria, Queiroz lançava mão de uma prática indesculpável: a de só lançar na folha em branco o que fosse produto perfeito e acabado de sua lúcida elucubração histórica, filosófica, política, econômica e social, tendente sempre a enquadrar o fato na perspectiva do justo, sem prejuízo da síntese, do conteúdo, da concisão e da clareza. Ele fazia às vezes de alter ego do povo. Sabia ele que por entre as redações jornalísticas circulam, a par dos nobres, os mais inconfessáveis interesses de grupos políticos e econômicos. Certa feita ele disparou: “Qualquer semelhança entre a Prefeitura de Porto Velho e a Granja Solar no epílogo de “A Revolução dos Bichos” pode não ser mera coincidência.” – disse ele, certa vez, citando o escritor e militante comunista George Orwel, o criador da expressão “Big Brother”, hoje popularizada pelo idiota programa da Rede Globo de Televisão. Mas não fez ácidas críticas apenas à administração petista, atacou com veemência e coragem a postura política dos conservadores, dos enganadores, de Ivo Cassol, donadons, deputados estaduais federais e senadores. Ele não tinha medo da verdade, tinha paixão por ela.
Se quando morre o homem fica a fama, no caso de Paulo Queiroz, morre o homem e fica a chama, a pira incandescente e flamejante da decência profissional, da abnegação vocacional incorruptível, da prática jornalística ilibada, humanística, etílica, risonha e simples de um escriba que tinha o rabo preso com o leitor. Em respeito à sua memória, saúdo seus seguidores e correligionários da mesma confraria redacional.