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"Indulto não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime", diz presidente do Supremo ao suspender decreto de Temer
Quinta-feira, 28 Dezembro de 2017 - 15:01 | da Redação
A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos do decreto publicado pelo presidente Michel Temer com regras mais brandas para a concessão do indulto de Natal a presos condenados. A decisão foi tomada diante de um pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentado à Corte na última quarta-feira contra a medida de Temer. “Indulto não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime. Nem pode ser ato de benemerência ou complacência com o delito, mas perdão ao que, tendo-o praticado e por ele respondido em parte, pode voltar a reconciliar-se com a ordem jurídica posta”,
Os dispositivos questionados pela PGR são o inciso I do artigo 1º, o parágrafo 1º do artigo 2º e os artigos 8º, 10 e 11 do decreto. O inciso I do artigo 1º concede indulto natalino aos condenados que cumpriram um quinto da pena, no caso de não reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência. Reduções de penas também estão previstas no artigo 2º. O artigo 8º beneficia réus que cumprem medidas alternativas à prisão ou tenham obtido a suspensão condicional do processo, e o artigo 10º extingue penas de multa e flexibiliza a reparação do dano causado. O artigo 11 prevê a possibilidade da concessão do benefício mesmo quando ainda há recursos em andamento.
A ministra explicou a natureza do indulto, adotado no Brasil desde a Constituição de 1891 “em situações específicas, excepcionais e não demolidoras do processo penal” a fim de se permitir a extinção da pena pela superveniência de medida humanitária. A medida, segundo a presidente, é um gesto estatal que beneficia aquele que, tendo cumprido parte de seu débito com a sociedade, obtém uma nova chance de superar seu erro, fortalecendo a crença no direito e no sistema penal democrático. “Indulto não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime”, ressaltou. “O indulto constitucionalmente previsto é legitimo apenas se estiver em consonância com a finalidade juridicamente estabelecida. Fora daí é arbítrio”.
Em relação ao Decreto 9.246/2017, Cármen Lúcia entendeu que os dispositivos impugnados pela procuradora-geral da República não se coadunam com a finalidade constitucional do instituto do indulto, pois “esvazia-se a jurisdição penal, nega-se o prosseguimento e finalização de ações penais em curso, privilegia-se situações de benefícios sobre outros antes concedidas a diluir o processo penal, nega-se, enfim, a natureza humanitária do indulto, convertendo-o em benemerência sem causa e, portanto, sem fundamento jurídico válido”.
Crimes de "colarinho branco"
A presidente também considerou plausível a alegação da PGR de afronta ao princípio da proporcionalidade, porque os dispositivos questionados “dão concretude à situação de impunidade, em especial aos denominados ‘crimes de colarinho branco’, desguarnecendo o erário e a sociedade de providências legais voltadas a coibir a atuação deletéria de sujeitos descompromissados com valores éticos e com o interesse público garantidores pela integridade do sistema jurídico”.
Em relação à multa, a decisão destaca que a pena pecuniária “não provoca situação de desumanidade ou digno de benignidade”, e lembra que o STF firmou jurisprudência no sentido de que, para que o condenado possa obter benefício carcerário, como a progressão de regime, é imprescindível o adimplemento da pena de multa. “Indulto de pena pecuniária significa, num primeiro exame, relativização da jurisdição e agravo à sociedade”, afirma a ministra.
Para a presidente do Supremo, as circunstâncias que conduziram à edição do decreto, “que, numa primeira análise, demonstra aparente desvio de finalidade”, impõem a concessão de cautelar para a suspensão da norma. A medida, conforme assinalou, não implica qualquer dano de difícil reparação, pois os possíveis beneficiários do indulto cumprem pena imposta mediante processo penal regular, “não havendo se falar em agravamento de sua situação criminal ou em redução de direitos constitucionalmente assegurados”.
A decisão suspende os efeitos dos dispositivos apontados pela procuradora-geral até o exame do caso pelo relator da ADI 5874, ministro Luís Roberto Barroso, ou pelo Plenário do STF.