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Cidades

Professora transexual denuncia que não consegue dar aulas

Quarta-feira, 24 Junho de 2009 - 17:14 | RONDONIAGORA


Uma professora transexual enviou à imprensa nesta quarta-feira carta aberta denunciando preconceito em escolas da rede pública do Estado. Victoria Bacon tem 27 anos, é graduada em Letras e Física, tem mestrado e afirma ter tido doutorado aprovado. A transexual mora em Porto Velho há 4 anos e afirma que não consegue lecionar.



Veja a carta na íntegra:

A falta de apoio da SEDUC e de políticas públicas de inserção de professores pertencentes à classe GLBT é notória e muito evidente. Digo, por experiência própria. Com 27 anos de idade, graduada em Letras e Física, mestra em educação e recentemente aprovada em doutorado, com 7 (sete) anos de experiência no magistério, abandonei toda uma história de vida e família deixando o Estado do Paraná e iniciando uma nova vida em Rondônia, desde 2004. Neste Estado tão carente de bons professores e, principalmente, na disciplina de Física, onde 70% das salas de aula de ensino médio rondoniense não têm o privilégio de terem um profissional formado e habilitado na área, estou sendo veemente perseguida por ser TRANSEXUAL.

Em todas escolas que executei atividades docentes, percebia desde o instante que tomava posse a não aceitação dos diretores, professores e alunos. Estes, começando pelos diretores, alegam que uma pessoa transexual ou travesti não possuem as devidas condições sociais de atuarem em sala de aula. A questão de nos travestirmos como mulher acaba afetando a moral e o costume de uma cidade que com uma altíssima porcentagem de evangélicos acaba sendo o nosso  “calcanhar de aquiles”. Na última escola que estive lotada Risoleta Neves, no bairro Tancredo Neves, faltou-me total apoio e, um grupo isolado de alunos, maquinados intelectualmente pela vice-diretora juntamente com seus pais, alegavam que eu não seria um bom exemplo para seus filhos pelo fato de eu vestir-me como mulher e ser transexual.

Cheguei a levar a conhecimento da direção da escola que esquivando-se dos fatos, preferiu deixar os acontecimentos emergirem e acabando toda a culpa cair sobre mim. Fizera-me um relatório difamatório e encaminhando à representação de ensino da SEDUC a pedido do senhor representante, percebi que não tive o direito de defender-me e este grupo mínimo e isolado de alunos que julgam-se superiores e homofóbicos conseguiram derrubar-me da escola.

Até o instante, desde o dia 10 de junho, estou aguardando comunicado do setor de lotação da SEDUC  e a mesma esquiva-se em lotar-me, pois a discriminação e a homofobia são claros nesta secretaria que nunca apoiou a inclusão social de transexuais ou travestis que são professores, creio que em todo Estado de Rondônia, só haja eu, motivo este que estou sendo o “bode expiatório” desta terrível experiência. Fiz duas provas através de concurso PSS aprovada em primeiro lugar com mérito. E o direito de lecionar está sendo me tirado por ideologias malditas e preconceituosas de pessoas que pensam ser superiores em relação a nós. Agora fica a pergunta: Quantos professores que com medo da reação desta sociedade podre e maldita formada por um grupo isolado de pessoas evangélicas que se rotulam donos da verdade têm medo de revelar sua opção sexual e serem feliz da forma como eles querem? Eu já vim como transexual. Sou feliz assim, vestida e trajada fisicamente como mulher.

Antes de me julgarem pela minha vida sexual de ser transexual, deveriam olhar meu perfil profissional que com certeza quem tende a ganhar é a sociedade e todo Estado de Rondônia já tão carente de professores de física (disciplina da qual leciono) e principalmente de baixos níveis em educação. Sempre me preocupei com a qualidade da educação pública deste Estado. Aqui resido há 5 anos. Deixei, como disse no início deste desabafo de vida, toda uma história de vida e família para trazer meus conhecimentos de vida e de formação acadêmica aos filhos de Rondônia... Vejam o que eu recebo??? É triste saber que em pleno século XXI  isto ocorra. Como Rondônia quer atingir sua modernidade seja material, econômica, industrial sem que a intelectual e a social ainda encontra-se inerte no tempo.

Não me calarei a vontade destas pessoas medíocres, formada por alunos, pais, professores, diretores e a própria SEDUC que não querem pessoas pertencentes à classe GLBT atuando nas salas de aula. Pagamos impostos, votamos, temos uma identidade e principalmente uma vida toda a enfrentar toda esta sociedade podre e maldita, é importante que mais irmãos que estejam na mesma situação também se manifestem. Contatei diversos jornais, deputados, senadores e outros meios de comunicação em Rondônia e fora do estado e todo momento venho recebendo manifestação de apoio.

Precisamos lutar pelos nossos direitos, como os negros lutaram para terem um espaço na sociedade e as mulheres serem reconhecidas como cidadãs há décadas atrás. É nossa vez. Pagamos o preço por divulgar abertamente nossa escolha de vida que imposta pelo destino e pela genética fomos conduzidos. A vida de sermos transexual, de sermos travestis de sermos gays. Não serei mais uma a ter de ganhar a vida na prostituição ou tendo que ser humilhada pela a vida sexual que possuo. Para isto estudei, fiz 2 graduações, especialização e mestrado. Recentemente fui aprovada no doutorado em educação. Isto prova o quanto tenho capacidade e o quanto posso ensinar aos filhos de Rondônia. Chega de preconceito. Basta a homofobia.

Assinado: Victoria Bacon

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