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A construção da BR-364, o outro braço da cruz
Sexta-feira, 08 Março de 2019 - 15:48 | por José Felinto*
Brasília, 02 de fevereiro de 1960.*
Paulo Nunes Leal, Governador de Rondônia em 1960: Sr. Presidente!
JK: Diga Paulo!
PL: O Sr. já ligou Brasília ao Centro-Sul, ao Nordeste e a Belém. Por que o Sr. não faz o outro braço da cruz, ligando Brasília ao Acre?
JK: Uai, Paulo! E pode?
PL: Pode, Sr. Presidente! Mas é negócio pra homem!
JK: Então vai ser!
Antes BR-029, hoje 364.
Na década de 1940 o mundo vivia sob os efeitos nefastos da II Guerra. No Brasil transcorria o Estado Novo chefiado por Getúlio Vargas, a Amazônia suspirava sob o efêmero II Ciclo da Borracha e onde hoje é Rondônia foi criado o Território Federal do Guaporé. Aluísio Ferreira, que havia sido administrador da EFMM, foi nomeado governador do Território Federal do Guaporé em 1943.
Quanto a construção da BR 364, esta já havia sido imaginada por Roquete pinto em 1916.
Vinte anos depois o futuro governador do Território Federal do Guaporé em discurso defende uma obra de grande envergadura próximo às fronteiras do Brasil: a rodovia Amazonas-Mato Grosso.
Em 1945 foi criada a II Companhia Independente com o propósito de construir uma rodovia para ligar Porto Velho a Vilhena. Por questões de logística os construtores usariam o caminho deixado por Rondon quando da construção das Linhas Telegráficas.
O extremo Norte do Brasil precisava ser ocupado de maneira que os imigrantes pudessem se tornar sedentários nesta região e não mais nômades como já havia ocorrido desde o século XVII. Merece destaque o capitão Ênio Pinheiro, pois a obra esteve sob o seu comando.
Em 1947, apenas 55km haviam sido vencidos da densa floresta e a companhia encerra suas atividades. O Brasil vivia um período de redemocratização e o médico mineiro Juscelino Kubitschek chega à presidência da República em 1956 com o slogan desenvolvimentista: 50 anos em 5. Ao que parece, Juscelino desejava colocar em prática as ideias de Washington Luiz cujo lema era "governar é construir estradas".
Aqui fica explícita a política brasileira que privilegiou a construção de rodovias, atrelando o transporte de cargas ao setor rodoviário relegando hidrovias e ferrovias à uma categoria de menor importância.
Neste novo contexto, o Território Federal de Rondônia - em 17 de fevereiro de 1956, o Território Federal do Guaporé muda de nome através da lei n° 2731. Muda a denominação do Território Federal do Guaporé para Território Federal de Rondônia - governado por Paulo Nunes Leal abandonará o ostracismo geográfico. O que outrora fora apenas projeto se consolidará com a política de JK.
Em 1960, JK ordena ao DNER a construção da BR 364 e diz que pretende inaugurá-la dentro do seu mandato. Os trabalhos têm início com a participação de várias empreiteiras entre elas a Camargo e Correia. Em janeiro de 1961 a obra foi inaugurada.
Um imenso rasgão se apresentava em meio a floresta amazônica e um corredor de acesso apresentava-se agora como uma viável alternativa para ocupar estas paragens amazônicas. Rondônia estava, portanto, "apta" a receber imigrantes para preencher o gigantesco vazio demográfico que era essa região.
Durante a década de 1960, o 5° BEC recebeu a missão de concluir e mantê-la em condições de trafegabilidade; o Brasil estava imerso na Ditadura Militar. Esse mesmo batalhão recebeu a missão de desativar a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, pois, de acordo com o governo, esta se tornara obsoleta e a continuidade do seu funcionamento gerava pesados prejuízos. Triste capítulo da nossa história que tornou-se realidade em 1972 com o último apito das locomotivas.
Desativou-se a Madeira-Mamoré e, partir daí, a ligação entre Porto Velho e Guajará Mirim foi feita através da BR-425.
Curiosidade: o trecho da rodovia BR-364 entre o município limítrofe de Candeias do Jamari e o campus da Universidade Federal de Rondônia, no Município de Porto Velho passa a ser denominado Rodovia Chiquilito Erse, de acordo com lei federal nº 12.454 de 26 de julho de 2011.
Com a abertura da BR-364 e o afluxo de pessoas nas décadas seguintes Rondônia ficaria conhecida como o Novo Eldorado, mas essa já é uma outra história.
*José Felinto é professor, graduado em História pela Universidade Federal de Rondônia (Unir).