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Hidrelétricas em Rondônia – De Samuel a Jirau e Santo Antônio

Quinta-feira, 02 Dezembro de 2010 - 16:18 | Tadeu Fernandes


Hidrelétricas em Rondônia – De Samuel a Jirau e Santo Antônio

A construção de hidrelétricas na Amazônia sempre foi um tema polêmico. Há os que defendem que tal construção altera o eco-sistema das florestas e dos rios, causando prejuízos irreparáveis ao meio ambiente e à sustentabilidade da maior reserva natural do planeta. Defendem que a matriz energética deve ser concentrada em outras regiões utilizando outros meios alternativos como biomassa, eólica e até atômica. Outros entendem que as potencialidades de reservas hídricas na Amazônia são suficientes para fornecer fontes de energia elétrica para todo o Brasil. Esta discussão vem sendo debatida há décadas.

Lembro do passado quando conversava com o Dr. Fouad Darwich no Palácio Getúlio Vargas, na época Procurador Geral do Estado. De repente apareceu o Governador Jorge Teixeira com aquele vozeirão e jeito espalhafatoso, portando seu boné militar e nos convidou para ver a maquete da hidrelétrica de Samuel que seria apresentada no galpão da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. E lá fomos nós. Vimos a maravilha que seria construída no Rio Jamari, em Candeias. Vi nos olhos do velho Coronel pingos de lágrimas e enorme emoção por ter conseguido convencer o Governo do General Figueiredo a construir aquela obra que, segundo ele, seria um marco no desenvolvimento do Território de Rondônia. Foi um dia marcante e constatei o quanto era importante para Porto Velho e Rondônia a ampliação do fornecimento de energia elétrica. No seu breve discurso lembrou que aquela obra saiu graças à intervenção do Ministro Mario Andreazza que era seu amigo. Aliás, o Ministro veio a Porto Velho várias  vezes, gostava daqui.

A hidrelétrica de Samuel foi construída ao mesmo tempo em que a de Balbina, em Manaus. Naquele tempo não havia necessidade de licença ambiental e as duas unidades geradoras  deixaram um lago que inundou milhares de hectares ao seu entorno. Certamente o custo-benefício não foi o que se esperava, mas não havia alternativa e tecnologia menos agressiva ao meio ambiente.  Mesmo assim saímos da escuridão e de constantes apagões para uma melhor prestação de serviços na área energética. Estas hidrelétricas tiveram suas construções no inicio da década de 80 e lá se vão quase trinta anos. Mesmo com enorme prejuízo ambiental e pouca geração de energia, Samuel foi importante para o processo de desenvolvimento do Território. Tínhamos energia somente até as 22 horas, quando então, era desligada e dormíamos no escuro sofrendo com o intenso calor de nossa região.

O desastre ecológico das hidrelétricas  de Samuel e Balbina foi  grande e devastador para o eco-sistema da Amazônia, tanto que o Governo Federal, através do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), publicou a Resolução n. 1, exigindo a partir de 1986 estudos de impacto ambiental para a concessão das licenças de instalação e operação. Os investimentos feitos pelo empreendedor em projetos para mitigação desse impacto são resultados diretos desta norma, representando uma nova era na infra-estrutura brasileira. Antes havia somente o projeto do empreendedor sem a necessidade de se ouvir representantes de outros setores da sociedade.

A Amazônia é o pulmão do mundo e está encravada na maior biodiversidade e água doce do planeta, possuindo meios naturais para a exploração científica, com ocupação de grupos e povos cuja existência deve ser respeitada, alguns deles devendo permanecer quase intocáveis. Todos estes aspectos devem ser considerados para a ampliação da exploração do potencial energético da Amazônia, mas que pode manchar o planeta com sérias consequências para as futuras gerações.

A Amazônia, cobiçada por todos os habitantes do planeta, abriga o maior potencial hidrelétrico do País com 260 mil MW. Deste total, 126 MW são aproveitáveis de imediato. Se deixarmos de utilizar estes recursos que são estratégicos para o nosso desenvolvimento, estaremos comprometendo nosso progresso e a consequente melhoria da qualidade de vida. Por outro lado, fica a indagação se devemos abrir mão da última reserva mais rica em recursos naturais do planeta.
As usinas do Madeira são as primeiras hidrelétricas a serem construídas na Amazônia após 1986 e só são autorizadas novas unidades com alvará de construção a ser expedido pelo IBAMA, tendo o desafio de  comprovar soluções fortes e palpáveis na preservação do patrimônio natural  da região com o maior rigor.

De Porto Velho nascerão as respostas quanto à viabilidade da construção de outras unidades geradoras de energia na Amazônia. Belo Monte no Pará certamente só será construída se as usinas do Madeira convencer aos órgãos ambientais e a população de que existe desenvolvimento com sustentabilidade e benefício sócio-econômico.

Esta aí para quem quiser conferir que Porto velho cresceu muito, mas empobreceu quanto à qualidade de vida. As obras públicas são deficientes e de baixa qualidade, não foram criados meios para que a população tenha um sistema viário adequado, não foram feitos os investimentos necessários em obras públicas. Algumas poucas foram iniciadas, porém mal planejadas.  As vias públicas estão abarrotadas de veículos, constroem-se prédios em grande quantidade, mas onde está a melhoria na segurança, na saúde e no lazer, no tratamento da água e esgoto?

A rodoviária é um péssimo cartão de visita. Os caminhões com suas cargas desfilam na Avenida Jorge Teixeira. Não construíram uma avenida de contorno ligando diretamente o porto e as poucas obras estão a passo de tartaruga. A cidade está um caos. A especulação imobiliária chegou a níveis absurdos. É hora de despertar nos administradores um melhor e eficiente planejamento, construções de melhor nível, buscando sempre o bem-estar da população, mas não é isso que estamos vivenciando.

Uma cidade com quase 500 mil habitantes não possui um estádio de futebol. O velho Aloísio Ferreira foi construído há mais de 40 anos quando a população não ultrapassava os 50 mil habitantes e ainda é local dos jogos do campeonato estadual. O que vemos é que os torcedores desfilam em carros com bandeiras de outros Estados e camisas dos times do Rio e de São Paulo. O ginásio Cláudio Coutinho, construído no Governo Jorge Teixeira, não é cuidado adequadamente. O próprio Teixeirão gostava de jogar basquete e muitas vezes o presenciei fazendo uma cesta na quadra do Cujubim, não permitindo que entrassem na quadra do ginásio de esporte  de sapato para não estragar o piso. Vinham grandes equipes do futebol brasileiro jogar em Porto Velho. O próprio Sócrates jogou pelo Corinthians contra o Ferroviário e daqui saiu para servir a seleção brasileira. A Hortência e a Marta jogaram no Cláudio Coutinho e outras equipes de vôlei e de basquete de elevado nível.

Voltando às hidrelétricas do Madeira destacamos que é formada por uma área de 15 mil ha de mata, parte já degradada, assumindo os empreendedores uma área de preservação permanente de 38 mil ha, com 500 metros de largura a partir da margem das represas, devendo fazer o monitoramento da flora e da fauna, bem como o estudo de impacto e preservação dos peixes em seu reduto natural.

Deveriam se envolver muito mais na solução das comunidades afetadas para dar melhor qualidade de vida, com negociações sérias e justas, dando toda transparência que querem a população da região, pois o que acontecerá nas hidrelétricas do Madeira será o modelo a ser empregado em outras construções de geração de energia elétrica.
Não se olvida os benefícios econômicos em favor da população de Porto Velho com aumento de emprego e da arrecadação do Estado e do próprio Município. Infelizmente não se tem notado por parte dos órgãos públicos a implementação bem planejada de investimentos que traduzam melhor qualidade de vida.

É necessário que se faça uso dos recursos de forma a repercutir no progresso, revertendo positivamente em melhor nível de educação e cultura, unidades hospitalares e atendimento de melhor qualidade, segurança pública. Lamentavelmente, tem-se a impressão que com o progresso instalou-se o caos no trânsito e muito pouco é feito nas áreas de lazer. A população mais carente se sente desprotegida e encontra pouca ou quase nenhuma condição de usufruir espaços e praças esportivas e de recreação.

A construção das usinas do Madeira é o laboratório que permitirá seguir construindo outras unidades geradoras de energia na Amazônia. Devemos ser recompensados com investimentos para aprimorar a condição de vida de cada um dos rondonienses, caso contrário, a  triste história se repetirá, quando retiraram as melhores espécies de madeira, levaram nossa cassiterita e deixaram somente devastação e enormes crateras; quando levaram quase 60 toneladas de ouro e deixaram a poluição e o mercúrio nos nossos rios, com prejuízos para a pesca e a saúde de nossa população; quando levaram nossos produtos agropecuários in natura e não industrializados; quando os diamantes da reserva Roosevelt saíram clandestinamente em grandes quantidades; quando levaram nosso látex dos seringais; quando utilizaram Rondônia para a exploração e transferência de riquezas para os Estados do sudeste, muito mais ricos.

Temos a maior reserva de diamantes do planeta. Será que mais uma vez este patrimônio natural não será utilizado para investir em áreas carentes, para incrementar o nosso desenvolvimento? Vamos aguardar.

Estamos pagando um preço muito alto pelo inchaço da cidade de Porto Velho. O poder público e os nossos governantes devem rever seus conceitos de administração e planejamento, implantando um plano viário moderno, com a construção de uma rodoviária interestadual, sendo imediatamente construída no início da cidade, servindo à atual, após reforma completa, para os ônibus urbanos, acesso a avenida de contorno e levando os caminhões de produtos agropecuários e industriais diretamente para o porto.

Todo o conjunto de problemas só será resolvido com recursos e maiores compensações pela construção das usinas, devendo ser aproveitado cada centavo para se empregar em investimento de qualidade no transporte urbano alternativo. Do jeito que as coisas estão só poderemos olhar com pessimismo este desenvolvimento desordenado que resulta em péssima qualidade de vida. Nós, portovelhenses, merecemos muito mais!

Com a conclusão das usinas do Madeira restarão as turbinas rodando e o ICMS será creditado aos estados consumidores, sobrando para nós, entregadores de toda a riqueza natural, alguns trocados representados por royalties, ficando o município desprovido de recursos para fazer frente à chegada de tantos imigrantes que aumentam a cada ano. É o momento de o novo governo olhar para o futuro e fazer parcerias com os atuais administradores municipais, caso contrário, o laboratório que se estabeleceu na Amazônia para a construção de unidades geradoras será condenado pela população brasileira, ficando prejudicado o inicio da construção de outras hidrelétricas.

A advertência serve para o governo federal que deve cobrar mais das construtoras e dos governos estaduais e municipais para que as compensações sejam justas, corretas e empregadas em benefício da população.

A futura presidente Dilma Roussef foi uma entusiasta da construção dessas duas usinas, tendo, inclusive, se defrontado com a ex-ministra Marina Silva para a obtenção das licenças ambientais. Assistimos a tudo isso e é chegado o momento de cobrarmos que sejam realizados mais investimentos que realmente nos beneficiem, caso contrário, resultará em prejuízo para o início da construção de outras unidades geradoras na Amazônia.

O Estado do Amazonas tem 98% de suas florestas intactas graças aos incentivos fiscais da zona franca que abarrotam seus cofres públicos, sendo o segundo PIB do Brasil. Rondônia, apesar de estar encravada na Amazônia Legal e ter um posto da Suframa, não se beneficia da instalação de grandes fábricas e dos mesmos benefícios concedidos a Estado vizinho.

Com o término das usinas, qual será o novo ciclo a nos esperar? Já tivemos o da borracha, o da cassiterita, o do ouro e agora o da construção das hidrelétricas do Madeira. Mais uma vez é de se indagar o que resultará de bom para um Estado que ao longo do tempo teve exploradas suas riquezas naturais.

Tadeu Fernandes é advogado

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