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Medicina defensiva
Segunda-feira, 07 Novembro de 2011 - 10:56 | Cândido Ocampo
Medicina defensiva se define como a adoção, por parte do médico, de uma postura voltada para a minimização de conflitos entre ele e o paciente. Nascida e amplamente adotada nos Estados Unidos da América é vista hoje por uma boa parcela dos profissionais como instrumento de profilaxia contra a crescente indústria das indenizações que floresce nos quatro cantos do mundo. Já em 2003, numa pesquisa coordenada pelo doutor David Studdet, da Escola de Saúde Pública de Harvard, em Boston (Massachusetts), ficou provado que quase 93% dos médicos americanos adotavam posturas recomendadas em manuais de medicina defensiva.
Defendida por alguns e criticadas por outros, o certo é que a medicina defensiva é mais um elemento que se interpõe na sagrada relação médico-paciente. A relativa facilitação do acesso ao atendimento médico, aliada ao impressionante avanço da biotecnologia, impôs ao profissional da medicina o atendimento em larga escala. A relação médico-paciente, antes baseada na confiança e admiração reverencial, se transformou em um procedimento impessoal, quase anônimo, tendo como reflexo um distanciamento oceânico entre ambos.
O médico de cabeceira deu lugar ao técnico altamente especializado, quase um autômato, não havendo espaço e muito menos tolerância para erros. Nesse contexto, não é exagero dizer que os atores nessa relação consideram-se quase inimigos naturais. Numa atitude instintiva de proteção corporativa, várias entidades médicas passaram a editar cartilhas ou manuais sobre medicina defensiva. Não que não seja legítimo promover a defesa de classe, desde que seus métodos sejam razoáveis. Problemas de ordem ética e jurídica surgem quando alguns manuais orientam subliminarmente (outros expressamente) que o médico deve, por exemplo, solicitar a maior quantidade de exames de auxílio diagnóstico possível, principalmente radiológico e de imagem, pois segundo este modelo impressiona o paciente os pedidos de ressonância magnética ou tomografia computadorizada, mesmo tratando-se de uma simples cefaléia, não precedente de trauma, que segundo alguns especialistas uma boa anamnese seguida de exame clínico pode resolver. É o abandono institucionalizado do critério científico para uma postura defensiva, perniciosa ao médico e ao paciente.
O Código de Ética Médica determina claramente ser vedado ao profissional exceder o número de procedimentos ou indicar atos médicos desnecessários (arts. 14 e 35). Ledo engano os que pensam que o excesso de exames de auxílio diagnóstico pode se transformar em instrumento de defesa. A uma, porque a grande maioria dos pacientes possui hoje informações suficientes que lhes confere juízo crítico sobre a conduta do médico. A duas, porque em conflitos jurídicos, por se tratar de questões de alta indagação científica, os juízes, não raro, se valem de peritos que vão demonstrar a desnecessidade de determinados exames para a correta auferição diagnóstica, podendo o excesso ser entendido como imperícia. A verdade é que tal postura gera o encarecimento desnecessário dos procedimentos, tanto na saúde pública quanto privada, não havendo dúvida que a melhor forma de se defender de potenciais conflitos judiciais é dispensar a atenção técnica e humana devida ao paciente e seus familiares. Aliás, orientação que também consta nos manuais de medicina defensiva.
Cândido Ocampo, advogado atuante no ramo do Direito Médico.
candidoofernandes@bol.com.br
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