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O médico e as organizações de saúde
Sábado, 10 Julho de 2010 - 10:09 | Cândido Ocampo
É sabido por todos que a profissão médica tem como um de seus esteios deontológicos a sua autonomia, não sendo obstáculo a esta condição o fato do profissional ser funcionário de uma organização de saúde, seja pública ou privada. Mesmo que a profissão esteja sujeita aos modelos sócio-econômicos vigentes e o médico transformado em assalariado ou servidor público, ainda assim ela não perdeu seu caráter liberal. O princípio técnico da liberdade de trabalho impõe que a medicina seja uma profissão que necessita de desenvoltura no seu exercício, pelo que ela representa de necessidade junto às situações mais circunstanciais e pelo alcance do seu elevado interesse público.
Se o exercício da profissão médica já se constitui numa prática livre consagrada pelos princípios liberais e assegurada pela Constituição Federal, mais ampla é a independência técnica do médico no desempenho de suas atividades profissionais. Nesse diapasão o novo Código de Ética Médica dispõe dentre seus princípios fundamentais (cap. I) que: “VIII - O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho”. Ainda no rol dos princípios fundamentais, o novel CEM também estabelece: “XVI - Nenhuma disposição estatutária ou regimental de hospital ou de instituição, pública ou privada, limitará a escolha, pelo médico, dos meios cientificamente reconhecidos a serem praticados para o estabelecimento do diagnóstico e da execução do tratamento, salvo quando em benefício do paciente”.
Assim, estando o ato médico legitimado pela necessidade, não sendo defeso em lei, sendo cientificamente reconhecido e tendo, quando possível, o consentimento do paciente ou seu responsável legal, não pode o hospital ou qualquer outra unidade de saúde pública ou privada limitar a ação do profissional quando este busca o melhor caminho possível para restabelecer a saúde do paciente. É relativamente comum hoje em dia hospitais, e principalmente empresas operadoras de planos de saúde, baixar normas restringindo o ato médico, limitando o número de exames de auxílio ao diagnóstico ou impondo limites a determinados procedimentos, tudo em nome da economia financeira. Nesses casos os profissionais médicos têm o dever ético de se rebelarem contra tais práticas ilegais e abusivas, denunciando os infratores aos órgãos públicos de fiscalização, pois as regras impostas pelos dispositivos deontológicos acima transcritos têm como principal objetivo salvaguardar o direito do paciente de ser atendido com o que de melhor a modernidade pode lhe oferecer.
Sendo a vida e a saúde valores absolutos e incondicionados, não pode o médico ser restringido ou cerceado em sua arte por normas burocráticas, sendo seu dever nestes casos invocar sua consciência ética e sua responsabilidade perante seu paciente, desprezando, quando necessário, tais imposições daninhas, empregando ao seu assistido os meios necessários e cientificamente disponíveis para o seu pronto restabelecimento.
Cândido Ocampo, advogado atuante no ramo do Direito Médico.
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