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O perigo de não registrar a conduta
Segunda-feira, 23 Fevereiro de 2015 - 18:15 | Cândido Ocampo
Em um processo judicial, o magistrado julga levando em consideração as provas produzidas por ele (de ofício) ou pelas partes. Não lhe é dado o direito de decidir com sua consciência, mas de acordo com sua convicção, que está adstrita ao contexto probatório insculpido nos autos. Não se pode confundir livre convencimento com livre arbítrio.
Nesse contexto, o médico, ao realizar qualquer procedimento, seja cirúrgico ou uma simples consulta, tem o dever legal e ético de registrar a conduta e mantê-la documentada à disposição dos órgãos fiscalizadores e do paciente.
Induvidoso que o prontuário se apresenta como um dos documentos mais importantes no exercício da medicina. Nele devem ser registradas todas as informações relativas ao atendimento. Além do quadro nosológico, devem constar detalhadamente a terapêutica e a evolução da patologia do doente.
Recebendo uma denominação equivocada, pois o “prontuário médico” não registra apenas a conduta do facultativo, mas inclui todo o acervo documental que vai de resultados de exames clínicos às fichas de ocorrências, relatórios de enfermagem, fisioterapia, nutrição etc., o referido documento deveria ser chamado de “prontuário do paciente”, pois a este pertence todas as informações nele registradas.
Dada a sua importância e imprescindibilidade para o exercício da medicina, o Código de Ética Médica (CEM) obriga o profissional (ou o hospital) a elaborar um prontuário para cada paciente (art. 87).
Em uma demanda judicial onde o atendimento médico esteja sendo questionado, o prontuário se revela como a primeira trincheira de defesa do profissional.
Como sobredito, o juiz julga de acordo com as provas produzidas nos autos do processo, e uma conduta registrada com suficiência e clareza pode ser a diferença entre a absolvição e a condenação.
Sempre digo que um “bom” prontuário (bem preenchido, com todas as informações supramencionadas) é melhor que um bom advogado, pois mesmo que a defesa técnica não esteja a contento, o magistrado não pode relegar as informações registradas no referido documento (princípio da verdade real, que também informa o processo civil).
Parece óbvio (e, é) o que vou dizer, mas é importante que o médico no seu dia-a-dia não deixe de preencher com detalhes e clareza (de forma inteligível) o prontuário de seu paciente.
O óbvio, por ser trivial, é muitas das vezes desconsiderado e até esquecido.
Com a crescente judicialização da saúde, principalmente envolvendo condutas médicas, a lembrança supracitada não é desmedida e muito menos impertinente. Quem já foi processado e questionado em sua atividade profissional sabe o que estou dizendo.
Infelizmente, a consciência das partes não tem valor probante em um processo judicial, e se a verdade real (ou ideal) nem sempre é alcançada, só nos resta a verdade jurídica (com todas as suas limitações) como instrumento de pacificação social.
Logo, sem provas não há verdade legal.
Cândido Ocampo, advogado atuante no ramo do Direito Médico.
candidoofernandes@bol.com.br